Fórum Cultural e Científico da UNIFUTURO
A
crise humanitária dos refugiados
Aldy Mello *
Ao
contrário da comoção social que presenciamos pela mídia, quando o Charlie Hebdo
foi atacado, em janeiro de 2015, em Paris, matando jornalistas e chargistas, a
Europa não reagiu da mesma forma, no caso dos refugiados da Síria e do
Iraque. O mundo esperava que os europeus
dissessem Je suis réfugié, como uma prova de solidariedade, criando no
continente uma forma de comoção coletiva.
A
crise humanitária, que se tornou manchete em todo o planeta, barrou diante à
incompreensão dos homens e às dificuldades dos Estados do continente europeu.
Para alguns, a fronteira foi fechada pelas reais condições de receber os
imigrantes, para outros, foi mesmo a incompreensão dos governantes, chegando-se
a construir cercas farpadas (casos só visto nos campos de concentração) e até
mesmo, como se fez em Berlin no tempo do nazismo, a construção de muros.
A
crise dos refugiados, talvez, seja a maior tragédia depois das guerras
mundiais. As pessoas, inclusive velhos e crianças, são todas europeias e buscam
asilo e refúgio em outros países, fugindo da pobreza, da falta de esperanças e,
sobretudo, da perseguição de guerra. Ninguém se torna refugiado porque quer.
Chega-nos
a imagem de uma Europa onde os governantes atuais parecem incapazes de lidar com um fato que sempre foi previsível de
acontecer. Segundo o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR), só em
2014 a Europa recebeu mais de 700 mil
refugiados e, só no primeiro semestre deste ano, os pedidos de asilo já
chegaram a 184 mil, vindos de sírios e afegãos, diz a União Europeia.
A
solidariedade é um sentimento presente nos tempos atuais, ultrapassando até as
fronteiras nacionais. É um terreno que em Sociologia já assumiu forma e
presença na vida moderna, como é o caso da solidariedade social tão comum. Ainda no mês de janeiro de 2015, assistimos
a uma prova de solidariedade sob a forma de comoção coletiva, diante dos atos
terroristas em Paris, quando do ataque ao jornal Charlie Hebdo e da morte
trágica de jornalistas e chargistas. Comportamento como esse tem sido comum em
nossos dias, principalmente na ocorrência de tragédias coletivas. Toda
solidariedade é um ato de bondade que se dirige a uma pessoa ou grupo social,
em situação difícil e delicada, com o intuito de ajudar.
Vinda
do francês solidarité, esse sentimento é abordado pelo ilustre filósofo francês
Émile Durkheim como existente sob duas formas, uma orgânica e outra mecânica. É orgânica quando praticada visando à
melhoria de um vínculo social. Isso ocorre comumente nas relações entre
empregados e patrões, muito usada nos relacionamentos sindicais. A
solidariedade mecânica é aquela que visa a um ajustamento entre indivíduos ou
grupos sociais, comumente oriunda de sentimentos religiosos, costumes ou mesmo
tradições. O apoio ao movimento Je suis Charlie foi um tipo de solidariedade
sociocultural, quando o mundo inteiro se uniu contra as ideologias radicais que
pregam o terrorismo.
A
solidariedade vem sempre carregada de padecimento com o sofrimento dos outros,
seja moralmente falando, através da assistência moral, ou materialmente, como
ocorre nas grandes tragédias. Numa ação
solidária existe mutualidade de interesses e objetivos e ligações
recíprocas. Nesse tipo de ação,
instalam-se compromissos e uma rede de relações fica estabelecida, garantindo e
assegurando a coesão social.
A
solidariedade humana promove os direitos humanos e ajuda a vencer a pobreza
daqueles que não têm ou tudo que tinham perderam. Ela é uma resposta às
necessidades humanas, aos sonhos perdidos, enfim, ela refaz a aventura do ser
humano em buscar incessantemente a felicidade.
Para
Albert Camus, escritor, romancista dramaturgo e filósofo francês do século XIX,
ou somos solidários ou somos solitários. Quando somos solidários, pensamos nos
outros, ajudamos as pessoas a superar suas dificuldades. Estamos vinculados ao
social, e nosso olhar sobre o mundo é outro.
Ao contrário, se optamos pela solidão, somos solitários, afastando-nos
dos compromissos sociais e distanciando-nos da comunhão de esperanças que
circula no mundo. A nossa capacidade de troca diminui e evapora-se a nossa relação
como contribuinte para solução dos problemas que afligem o planeta terra.
Os
dicionários dão várias definições de solidariedade, expressando sempre
a
ideia de que sua prática requer
simpatia, ternura e até piedade aos mais pobres e necessitados. No entanto, a solidariedade não deve ser
vista apenas como associada à ação ou ações de caráter assistencialista praticadas
por pessoas ou grupo de pessoas.
Ela pode ter um caráter público, praticada pelo Estado, com o intuito de
promover políticas públicas de proteção social. Há autores que defendem essa
teoria, desembocando suas consequências na liberdade e na democracia. Assim, a
solidariedade deixa de ser meras ações individuais ou grupais para ser um
princípio
político dotado de caráter coletivo e social
em que o Estado efetiva a sua
intervenção política, fortalecendo a liberdade dos homens e agindo democraticamente.
Para
muitos, foi um grande espanto, pois imaginavam que o continente europeu não
podia mais revelar a triste imagem das ocorrências das duas guerras mundiais ou
mesmo da caída do regime comunista, quando os fatos ocorreram quase na mesma
proporção, com refugiados vindos do Leste Europeu.
Será
que a Europa perdeu sua capacidade de receber imigrantes? A União Europeia, que
há muito deixou de ser união, perdeu suas lideranças políticas? As decisões tomadas têm se pautado mais nas
razões eleitoreiras e nas políticas populistas do que nos julgamentos
racionais?
Esse
tipo de política migratória ou falta dela tem sido a predominante nos países desenvolvidos,
a exemplo dos Estados Unidos com o México e outros países da América
Central. A linha do tempo nos diz que os
governantes procuram buscar mais a retórica do que a solução dos problemas,
quanto mais se eles forem problemas de massa.
Foi
preciso o mundo inteiro se comover com o horror de um retrato em que Aylan
Kundi estava morto numa praia da Turquia, no mar Egeu, para que a Europa
reagisse e o mundo acordasse para o drama dos refugiados. Onde está a
solidariedade?
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* Ex-Reitor da UFMA e do CEUMA, membro do IHGMA e da ALL.
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Brasil,
01 de novembro de 2015
Universidade
Planetária do Futuro - Ano V
Grupo ARTFORUM Brasil XXI - 15 Anos
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Diretora de Assuntos Científicos:
Profa. Dra. Maria de Fátima Felix Rosar
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Coordenação Cultural e Divulgação:
Ana Felix Garjan
Ana Felix Garjan
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